Eram meados da década de 1990 quando o empresário Fabio Pergher enxergou uma oportunidade. O álcool gel era um produto muito vendido nos Estados Unidos, mas não existia no Brasil. Ele tinha testemunhado isso em algumas de suas viagens àquele país. Então, teve a ideia de introduzir o produto no Brasil.
Pergher logo descobriria ser cedo demais para o País receber o álcool gel. Não havia cultura de limpar as mãos com frequência usando álcool. Mesmo assim, decidiu arriscar.
Tentou, por exemplo, fornecer gratuitamente o produto em salões de embarque nos aeroportos como uma forma de educar o público. As autoridades aeroportuárias, no entanto, não entenderam a ideia como um ato educativo, mas de marketing — e quiseram cobrar uma taxa. Nada feito.
Em outra ocasião, Pergher ofereceu gratuitamente a uma rede de cinemas que dispunha de mais de 70 salas um lote de sachê de álcool gel. A lógica de experimentação era simples: “quando as pessoas compram pipoca, elas não param no banheiro para lavar as mãos. Nada mais prático do que, já sentadas na cadeira, abrirem o sachê e higienizarem as mãos antes de tocarem a pipoca”.
Depois de 45 dias, ele foi conversar com os gestores da rede de cinema na esperança de tirar o primeiro pedido. A notícia que recebeu, porém, foi outra. “O gerente me apresentou uma conta de 40 saquinhos de pipoca de pessoas que acharam que o álcool fosse, na verdade, tempero. Em vez de tirar o pedido, eu tive de pagar pela pipoca”, relembra.
A virada
Naquele momento, a Start Química, que pertence ao grupo Lima & Pergher, já tinha uma operação de distribuição montada nos Estados Unidos. Era uma tentativa de explorar o mercado americano, uma vez que no Brasil o negócio ainda não havia engrenado.
Foi então que, no final da primeira década do milênio, estourou a crise do H1N1 no Brasil. O comportamento das pessoas mudou. O brasileiro começou a buscar o álcool gel e a Start Química começou a produzir o álcool gel com maior intensidade. Aliás, a marca do seu álcool gel, o Accept Gel, ficou conhecida nacionalmente.
Ao mesmo tempo, os Estados Unidos começaram a criar barreiras para produtos estrangeiros, o que facilitou a decisão de Pergher de voltar o foco para o mercado brasileiro.
Como se sabe, o H1N1 foi uma crise sanitária pequena perto do que o mundo enfrentaria cerca de uma década depois.
A Covid-19
Pergher havia passado o Réveillon de 2019 para 2020 com a família na Europa. Dias depois, ele estava em uma farmácia de Paris. Um turista chinês chamou sua atenção. Ele colocava grandes quantidades de álcool gel em sua cestinha de compras antes de passar no caixa.
Ao mesmo tempo, a TV da farmácia mostrava no noticiário o tal “novo coronavírus” que já havia feito estragos na China e começava a alcançar o Leste Europeu.
Pergher não hesitou e telefonou para o chefe do departamento de compras:
— Samuel, como está o estoque de polímero para fazer álcool gel?
— Fique tranquilo, temos estoque para seis meses.
— Então, compre para cinco anos.
— Cinco anos? Tem certeza?
— Tenho, sim. E como está o estoque de válvula pump, Samuel?
— Estamos supertranquilos: temos estoque para um ano.
— Samuel, aumente o estoque para seis anos.
Num primeiro momento, podia parecer exagero de Pergher, mas não era. Pouco tempo depois, o estoque de cinco anos já era insuficiente e a empresa precisou comprar todo o polímero disponível no Brasil, e ainda importar mais. Em tempo: o polímero é uma das matérias-primas do álcool gel e a válvula pump é aquele bico que você aperta para expelir o álcool do tubo.
Ainda no primeiro trimestre de 2020, a pandemia chegou ao Brasil, como se sabe. Meses depois, a Start Química teve seu recorde histórico de produção, triplicando o número de máquinas dedicadas a envase, que passaram a operar 24 horas por dia, sete dias por semana, com mais de 600 novos funcionários contratados. “Foi o único ano na história da empresa em que não paramos na Sexta-feira da Paixão”, lembra Pergher. O volume mensal de álcool gel produzido aumentou 6.000%.
Isso, porém, não aconteceu de forma tranquila. Houve pressão de todos os lados. O Ministério Público ameaçava confiscar o produto na fábrica se faltasse álcool gel em hospitais; antigos clientes reclamavam por não ter prioridade; a empresa estava proibida de aumentar o preço, mas os insumos custavam mais a todo momento; a cana-de-açúcar acabou na região, obrigando a empresa a buscar em outros estados, o que aumenta a tributação e o custo de transporte; produtos pirateados começaram a ser vendidos; e por aí vai.
O aprendizado-chave
A capacidade de se reinventar talvez tenha sido o grande aprendizado que as duas crises — H1N1 e Covid-19 — trouxeram para a empresa. “Ficar reclamando não é uma característica de um empreendedor de sucesso. É preciso ter a capacidade de reinvenção permanentemente porque o mundo muda todos os dias”, observa Pergher.
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